Rosa Azul Imaginária

SE FOSSE POSSÍVEL ELA SABER

Ah...Se ela soubesse da quietude da vida sem ela. (Se ela soubesse) Aquele silêncio dos mortos e das covas. Aquela falta de vontade dos defuntos que estão frios Em plena decomposição. Já não tem mais perfume só mau cheiro. Já não tem alma, resquícios. Ah...E se ela soubesse como é difícil, se abstrair do mundo, E ainda viver. E guardar, e ter entalhes por toda profundeza. Se ela soubesse como é difícil ter que respirar dentro do caos, do sufoco, do abafado, Sendo sufocado pelo próprio corpo.Sem espaço, sem defesa, Talvez, só talvez não adiasse, não demorasse, não prorrogasse. Se ela soubesse da calma dos subterfúgios usados Para deixar de viver continuando aqui... Se fosse possível descrever o medo da inquietação. O terror da solidão... Das desculpas ardilosas que tenho que me submeter.. Se pudesse presumir os fatos como estão.. Se soubesse das feridas que não cicatrizam, Do calar. Do emudecer. Do silêncio mortal que se instalou em vida regrada... Dos jogos de não dizer a verdade, Das vistas grossas ao destino certo... Como tudo ruiu, desmoronou.... Ah...e se ela pudesse sentir... Perceber por qualquer dos sentidos. Por um só que fosse. Ter conhecimento... do estado de decomposição...que está instalado... Ah...se ela pudesse ao menos perceber, notar, Mesmo que não tivesse qualquer pena, qualquer pena ou mágoa, Ou nem mesmo um sentimento belo...Uma compaixão que fosse... Se ela pudesse transcender... Por um só momento.. O quanto a situação se tornou intolerável O quanto insuportável está sendo, Ficar trancada dentro daqui! Sufocada pelo próprio corpo, Aprisionada na própria alma... Emudecida, completamente morta. Tão diferente de quando ela aqui morava.... Ah...se ela soubesse da quietude da vida sem ela... Do aniquilamento que se instalou... Da minha prostração em vida. Dos momentos de espera sem retorno.... Da dor no corpo e na alma que urgente se faz partir. Dos medicamentos que não debelam a doença.. Ah...se ela soubesse o quanto o ausentar-se está me despedaçando. Sentir o quanto sua ausência está me destruindo, Talvez, sim,.porque..... ainda há um talvez...Ela pudesse começar a pensar em voltar.

Ciclos

Ciclos O botão da luz, O sonho desfeito, O coração partido, Sem nenhum jeito. A gente corre, corre. Corre, corre. Até que um dia para, Para, para. O sol nasce, Descansa. O dia renasce, Se cansa. Difícil saber quando a morte, (mera causalidade) Torna-se, de pecado, À total obrigação!

SONHOS

Meros instantes de fuga da realidade, Convites do inconsciente ao obscuro, À uma visão amena. Do não planejado. É perder-se na neblina da mente, No fator acaso, Na coincidência, Sonhos reais, Sonhos desfeitos. Viagens e passeios transcendentais, Frutos de vivências, Ou da imaginação. Perturbantes ou perturbadores, Calmos e edificantes, Enganadores, mas felizes, Irreais, ou vividos, Sempre sonhados!

DE NOITE

Debaixo do guarda-chuva, O vento continua soprando. Debaixo da escuridão, A luz continua entrando. Debaixo de sono profundo, A consciência continua andando. Tudo igual, Nada escondido, ignorado. Debaixo do manto da noite, O negrume é mera circunstância.

Gritos do Silêncio

Nem sempre o desequilíbrio resoa, Nem sempre o louco GRITA! Nem sempre o desequilibrado é barulhento. A loucura é por vezes pacata.. Calma! Quieta, muito quieta. Calada, muito calada. Muda. Eterno silêncio... Dentro do Silêncio, mil sons! Dentro da loucura muita dor. Dentro da dor mil gritos, Gritos no silêncio, Da loucura calma, Do desequilíbrio calado, Tudo invisível e quieto.

ESTÔMAGO

É o estômago que revira agora... (à estas alturas que importa isso... Ou aquilo?) É a comida que alimenta a boca grande, Que come tanto que o estômago dói. Mas isto é depois: De engolir o mundo, De estar em frangalhos, De tanto obedecer, De tudo rejeitar. Não se sabe se é a boca grande, que come muito, Então o estômago dói muito, Ou se é o estômago que dói muito e, A boca grande come muito, Para o estômago não vir a doer. Ou a boca grande engoliu tanto e tudo que agora tudo dói muito!

Aviso

“... estiquei a mão e puxei a malha no banco do carro, saltaram mil papeizinhos picadinhos, tão minuciosamente picadinhos, junto a um envelope todo decorado, que ainda por cima tinha o símbolo daquele triângulo com o terceiro olho, ( sabe qual né..)..não pude deixar de me espantar....Alguém estava querendo me contar algo. Havia o terceiro olho que me olhava expressivamente! Achei aquilo tudo suspeito...e estranho, voando à minha vista. Instintivamente recolhi tudo, coloquei rapidamente no envelope decorado, e enfie tudo no bolso da calça, o bolso de trás da calça, apressadamente. Aí vi você chegando lá longe, disfarcei, tudo super instintivo e imediato.Rápido como sempre é. Muitas vezes isso já tinha me ocorrido: fazer coisas instintivas e rápidas, como se não fosse eu agindo e sim alguma outra pessoa. (alguém estaria querendo me dizer algo?) Achei que sim.Com certeza sim. Vim voando e ansiosa para a perícia.Cheguei, me enterrei apresadamente no quarto, fechei a porta, louca de curiosidade, ainda não parecendo eu.Em perfeito transe... Enchi-me de paciência e comecei a separar os papéis como um grande e pequeno quebra-cabeça. Havia duas cores de papéis, uns mais azulados, os outros beges, mas a penumbra do quarto não ajudava em nada. Confundia. Cheques, se tratavam de cheques...e você deseja idéias de números para loteria: estava com muitos na frente, vários recortes com muitos números. Mas apenas um nome. E num pequenininho pedacinho, muito mínimo, diria uma tripinha, de papel sujo e meio dobradinho, um nome...a letra bem pequena..No papel bege. Mas um nome, o que é mais estranho que possa parecer, um nome completo! Sim,nome e sobrenome, tudo certinho, numa tirinha incrivelmente pequena de papel, do bege. Evidências...Realizada a perícia tudo poderia ser concluído, embora tantas dúvidas surgissem juntas, complexas e com certeza bem estranhas, ao mesmo tempo: óbvias. Fiquei longo tempo olhando pra tudo aquilo, eram como estrelinhas no céu, montes de papéis picadinhos...Alguns conseguiram encaixar...Outros sem lógica...Tal qual a vida...ficaram soltos, solitários, sozinhos. Peguei o pequeno nome, dobrei. Ficou bem menorzinho. Quase nada agora. Tranquei-o numa pequena caixinha de jóias, linda, vinda do Cairo, presente de uma tia. Antiga. Está lá ainda. Misterioso e conclusivo recado de Deuses?”

Ditadura Obscura

Querem todos que se viva em perfeita escuridão. Ou em névoas de penumbras. Acham todos que a visão deve falhar, faltar. Assim como a mente deve permanecer insonsa. Corroída como em doença grave. Manter o corpo inerte, mas saudável. Dissimular. Permanecer quieta e inteligente. Ignorar da perícia: os resultados. Das revelações da vida como se alguém sobrasse em seus ouvidos: Não reconhecer os atos óbvios. Ocultar de si mesmo os sentimentos revelados. Abstrair, desprezar o mais puro dos sentidos. Debandar da própria realidade embaraçada. Querem todos que nada os aborreçam. Que as bocas se mantenham unidas apertadamente. Que os lábios escancarem em sorrisos largos: Meigos, sinceros, e surdos. Querem todos o fingimento explícito: Daqueles que engana à todos. Querem viver na neblina densa e cinza: Em dia claro e ensolarado. Querem suportar o destino cruel, Sem queixas, sem zangas, sem reclamações. Sem ao menos mágoas. Querem desprezar o presente, Especulando futuro incerto. Querem que acreditemos em lorotas e mentiras baratas. Conscientes da realidade exclamativa. Querem que sequemos ao relento, Queimemos no fogo do não ser, Do não saber, do não sei, E nada mais... Desde que permaneçamos quietos e não incomodemos, Deste modo podemos ficar, e usufruir o tempo que nos resta!

DESCASO

Você que me ensinou a sorrir, Que me ensinou até mesmo a rir, Você que abriu as cortinas, Que escancarou as janelas, Fez o vento entrar por elas... Você,que tão bem e tão mal me fez, Agora, sem mais nem menos resolve partir... Se ir. Deusa da impaciência, Amada do imprevisível, Dona do seu nariz, Me fez feliz quanto quis, Agora resolve partir, Sumir. Fechou as janelas, Cerrou as cortinas, Apagou a luz, E se foi. Levou meu sorriso, Meu riso morreu. Meu ar se esgotou, Meu corpo parou. Minha alma sofreu, Você nem ligou.

Ana Acquesta

Ana Acquesta
Ana Acquesta